A VERDADEIRA CAUSA DA SENTENÇA DE CRISTO





Aproveitamos da oportunidade para levantar aquela tese de que Jesus fora condenado à morte por ter se insurgido contra o Império Romano, como creem alguns clérigos, evangélicos e outros crentes. Antes de entrarmos no mérito da questão, é bom lembrarmos que Jesus inaugurou o ano um com seu nascimento, em Belém de Judá, antes conhecida por Belém Efrata, quando seus pais, José e Maria foram ali recensear-se, por ordem do imperador César Augusto. Durante a infância, Jesus residiu em Nazaré, cidade que pertencia à província da Galiléia, administrada pelo procurador Herodes. Esta era separada da província da Judéia pelo Rio Jordão, onde Jesus, em sua fase adulta, seria batizado por João Batista. Saindo de Nazaré, onde convivera com os pais, foi residi na região da Galiléia, onde formou seu grupo de doze discípulos, que O seguiram pelo resto da vida. Durante sua convivência entre a Galiléia e a Judéia, praticou atos inexplicáveis e extraordinários, em forma de milagres, curando doentes, ressuscitando mortos, expulsando espíritos maus, fazendo paralíticos andarem, cegos enxergarem, mudos falarem, transformando água em vinho, efetuando pescas milagrosas, enfim, pregando uma doutrina, que encantava o povo e incomodava os líderes judaicos. Daí então, após adquirir fama, passou a ser perseguido pelos que lhe invejavam, cujos invejosos passaram a armar artifícios para prendê-Lo e matá-Lo. Após frustradas tentativas, depararam com uma oportunidade de ouro, quando um dos discípulos de Jesus, Judas Escariotes, negociou com eles a prisão do seu mestre por trinta denários, moedas de prata, de maior circulação no Império Romano.
A partir de agora, convenhamos chamar Jesus, em seu processo de julgamento, de Acusado, para não chamá-Lo de réu; enquanto os líderes judeus, de acusadores e Pilatos, de juiz. A fase inicial desse processo tem início no Horto das Oliveiras, quando Judas, com um beijo traidor, entrega Jesus a um grupo de judeus, que para ali viera prendê-Lo a mando do chefe dos sacerdotes, dos doutores da lei e dos anciãos. Era noite e os fariseus estavam tão obcecados em seu objetivo, que nem perceberam quando, sacando de sua espada, Pedro cortou a orelha de um dos empregados do chefe dos sacerdotes. Nem viram também, quando Jesus a repôs no lugar, sarando-a.
Na sequência, conduziram-No até o sumo sacerdote Anás, dirigente das investigações preliminares antes do julgamento oficial presidido por Caifás. Este, reconhecendo que a causa não era de sua alçada, encaminhou-O à presença do Conselho, formado pelos senadores do povo, pelos chefes dos sacerdotes e pelos escribas. Na ocasião, os chefes procuravam algum falso testemunho contra Jesus, a fim de O condenarem à morte. Embora terem surgido muitos falsos testemunhos, nada encontraram de substancial às acusações. Então, o sumo sacerdote disse: “Eu te conjuro pelo Deus vivo que nos diga se tu és o Messias, Filho de Deus” Jesus respondeu: “É como você acabou de dizer. Além disso, eu lhes digo: de agora em diante, vocês verão o Filho do Homem sentado à direita do Todo-Poderoso e vindo sobre as nuvens do céu” Ante tal resposta o sumo sacerdote retrucou: “Blasfemou! Que necessidade temos ainda de testemunhas? Nós mesmos ouvimos de sua própria boca. O que vocês acham?” Responderam: “É réu de morte!” Em ato continuo, cuspiram-No, esbofetearam-No e deram-lhe bordoadas, em meio a insultos e humilhações.
Em face da comprovada inocência de Jesus, sentiram-se sem força e sem competência para consumarem o julgamento, conforme a interpretação de suas leis. Por isso, decidiram leva-Lo a presença de Pilatos, quem continha mais poder e autoridade para tal mister. Ante este, afirmaram: “Encontramos este homem fazendo subversão, entre nosso povo, proibindo pagar tributo ao imperador e dizendo ser o Messias, o Rei.” Aí Pilatos o interrogou: “Tu és o rei dos judeus?” Respondendo, ele disse: “É você que está dizendo isso.” Ante o que ouviu, o Pôncio disse aos chefes dos sacerdotes e a multidão: “Não encontro neste homem nenhum motivo de condenação.” Eles, porém insistiram: “Ele está provocando revolta entre o povo com seu ensinamento. Começou na Galiléia, passou por toda a Judéia e chegou até aqui.” Ao ouvir isso Pilatos perguntou se Ele era galileu. Ao certificar-se, encaminhou-O a Herodes Antipas, procurador da província da Galiléia, quem se encontrava em Jerusalém, naquele dia, para que O interrogasse. O governador agira assim, visando agradar Herodes, uma vez que, tempos antes, aquele mandara matar deste, alguns súditos. Considerando-se então prestigiado, pelo Pôncio, ambos se reconciliaram.
Perante Herodes, o processo passaria por mais uma fase, quando por ele Jesus foi submetido a um severo interrogatório. Este foi feito mediante um coro de acusações por parte dos líderes judeus. Como também nada foi encontrado nele em matéria de culpa, a dita raposa, como Jesus, certa feita o designara, com muito menosprezo e zombaria, mandou vesti-Lo com roupa de gala e O remeteu novamente ao juiz da contenda.
Como observadores do julgamento, ou seja, antes de, imaginariamente, ingressarmos no Sinédrio, o mais graduado tribunal dos judeus, conheçamos um pouco da biografia do julgador. No ano 26 d.C, Pilatos fora nomeado com quinto procurador da Judéia, era romano da classe média alta. Embora não se conhecesse o prenome, seu nome Pôncio sugere ser de origem samnita e o cognome Pilatos, provavelmente tenha surgido entre seus colegas militares. Ele exercia plenos poderes sobre a província da qual era procurador; sendo responsável pelo exército de ocupação, aquartelado em Cesaréia. Durante a páscoa e outras grandes festas, ele se transferia para Jerusalém, levando a mulher, além de um destacamento para dá segurança à cidade. Tinha amplos poderes de vida e de morte; podendo reverter as penas capitais, decretadas pelo Sinédrio. Controlava o templo, o fundo monetário e nomeava os sumos sacerdotes. Famoso por sua tirania e sanguinolência, mandara executar centenas de judeus, por terem protestado contra o mau uso do dinheiro do templo. Em outro feito, mandara matar centenas de samaritanos, no momento em que oravam no monte Gerezim. Eis o perfil desse sórdido julgador em questão.
 Ao regressar, pela segunda vez, a presença do Pôncio, este convocou o chefe dos sacerdotes e os líderes do povo a quem lhes disse: “Vocês me trouxeram este homem como se fosse um agitador do povo. Pois bem eu já o interroguei diante de vocês. Não encontrei nele nenhum dos crimes de que O estão acusando. Aliás, também Herodes não o encontrou; pois o mandou de volta para nós. Como podem ver Ele nada fez que mereça morte. Vou castiga-Lo e depois O soltarei”.
Pilatos cumpriu parcialmente com sua promessa, mandando açoitar Jesus, mas não o mandando soltar. No fundo, ele reconhecia que o acusado estava sendo vítima de pura inveja; porém, apesar de receber grande pressão, ainda tentou uma possibilidade de soltura do Acusado. Lembrou-se que, pela festa da Páscoa era costume soltar um prisioneiro, daí então perguntou: “Quem quereis que eu solte: Jesus ou Barrabás.” Todos gritaram: “Barrabás.” Este prisioneiro, judeu, ali se encontrava preso por ter matado um soldado romano, em Cafarnaum, durante um motim, contra as forças dominantes.
Retroagindo, no instante em que eles se manifestaram pela absolvição de Barrabás, a mulher do governador mandou um emissário preveni-lo, de que não se envolvesse com aquele justo. Novamente, então, o dito juiz perguntou: “O que fareis com Jesus, o rei dos judeus?” Aí, todos falaram: “Crucifica-o.” Pilatos perguntou: “O que fez este homem?” Eles, porém, gritaram com mais força: “Seja crucificado!” Percebendo que nada conseguia, mandou buscar uma bacia, onde lavou as mãos dizendo: “Eu não sou responsável pelo sangue desse homem. É um problema de vocês.” O povo todo respondeu: “Que o sangue dele caia sobre nós e sobre nossos filhos.” Ante o que ouviu e bastante pressionado, mandou flagelar Jesus e o entregou para ser crucificado.
Dizem que o Pôncio procedeu assim com medo de alguma rebelião por parte do povo, caso não cedesse às imposições judaicas. Na verdade, esse temor era muito maior, por ser iminente, do que o receio de contrariar Roma, de menor proporção. Fora envolvido pela pressão, dado a sua fraqueza de caráter. Ora, já que comandava um contingente militar muito grande e com o qual poderia impor sua força e autoridade, não teria como recuar perante aquele grupo de judeus. Preferiu ouvir os brados dos inimigos de Jesus, bem como a voz de sua própria fragilidade moral. Sua falta de caráter tornou-se evidente, quando em sinal de menosprezo e arrogância, mandou pendurar uma tabuleta no alto do madeiro da cruz, com a seguinte inscrição em grego, latim e hebraico: “Jesus Nazareno Rei dos Judeus”.
Constatamos assim, que a verdadeira causa da condenação de Jesus fora a inveja por parte dos seus inimigos. Jamais teve, como motivação, qualquer subversão dele contra o Império Romano. Para reforçar essa tese, citemos aquele episódio, entre Jesus e alguns empregados dos líderes judeus. Na ocasião, um deles indagou-lhe: “Mestre, é lícito pagar tributo a César, em dia de sábado?” Aí, pedindo uma moeda emprestada, perguntou: “De quem é esta figura estampada na moeda?” Responderam-lhe: “É de César.” Jesus falou: “Dê a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”.
Em outro momento um oficial romano de nome Jairo, mandou pedir urgentemente a Jesus, que fosse até sua casa, a fim de curar-lhe um empregado, à beira da morte. O Mestre não só o curou como elogiou a prodigiosa fé do oficial.
Por outro lado, ainda defendo a tese de que Jesus não se insurgira contra o Império Romano, há o fato de que, caso assim fosse, o governador seria o primeiro a mandar seus soldados prender Jesus, no Horto das Oliveiras, em vez de irem judeus armados de espadas e cassetetes. Também, quanto a pressão popular, o próprio senador José de Arimatéia fora envolvido, quando, de forma sigilosa, cedeu seu túmulo para que o corpo de Jesus fosse sepultado.
Finalmente, para quem deseja saber o fim do “todo-poderoso” Pilatos, este teve um final de vida idêntico ao de Judas Escariotes: o enforcamento. Aliás, a traição e a covardia serviram-lhes de prêmio por não terem aceito Jesus como o Salvador da humanidade.




Paulo Oliveira

Promotor de Justiça e Historiador

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